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A Fita Branca (Das Weisse Band)

Logo no começo de A Fita Branca, o narrador avisa que os acontecimentos que se verá a seguir podem não ter uma explicação, mas que ajudam a entender o que aconteceria com seu país, a Alemanha, nos anos seguintes, época do nascimento do nazismo. Talvez pretensioso demais da parte de Michael Haneke querer dar a palavra final sobre a origem de um dos momentos mais odiados da história. A suposta pretensão, no entanto,  logo é desculpada por se tratar de uma verdadeira obra-prima do cinema, certamento a melhor produção realizada em 2009. Semelhante a Dogville, de Lars Von Trier, o longa do alemão não precisa recorrer a artifícios como a falta de cenários do dinamarquês, seu filme é muito bem estruturado.

Em um pequeno vilarejo germânico, uma série de estranhos acontecimentos chocam a população. Apesar de nada indicar que eles tenham alguma relação entre si, os moradores não deixam de tentar encontrar o culpado por todos aqueles problemas. Em uma sociedade opressora, baseada no autoritarismo e no castigo, a todo momento se insinua a possibilidade de os incidentes serem atos de vingança contra os poderosos. Apenas se insinua, ninguém chega a mencionar a possibilidade. Da mesma forma, sempre um grupo parece estar um passo a frente quando descobertos os crimes, mas nunca são tidos como suspeitos. As crianças, filhos destes mesmos poderosos, são apenas versões ainda mais puras e inocentes de seus pais, nunca poderiam fazer nada de mal, pode-se alegar.

A punição, quem recebe, é os irmãos Klara e Martin, mas por outro motivo. Filhos do pastor local, eles são castigados por um terrível ato: chegam em casa mais tarde do que o de costume. Para aprender a manter a pureza, ambos terão que carregar consigo a fita do título, além de levar uma surra. Haneke, que já declarou sua preferência por deixar o melhor para a mente de seu espectador, filma o castigo de forma magistral, com uma incrível violência sem a necessidade de mostrar nada. Na cena, Martin pega a vara que seu pai usará, entra na sala e a câmera fica fixa, focando a porta fechada enquanto se ouvem os gritos das crianças. Essa mesma opção de não mostrar, já havia chocado muitos dos que viram seu Caché.

Mesmo fugindo do aspecto de Dogville e sua falta de cenário, a presença do narrador não nega que também se trate apenas de uma espécie de fábula cinematográfica para explicar as mazelas do século XX. Este tom fabular fica ainda mais gritante no filme de Haneke por uma característica peculiar, apenas seus personagens infantis tem nomes. Klara e Martin, são filhos do pastor, Sigi, uma das vítimas, filho do Barão, há ainda o médico, o administrador, o fazendeiro, e suas esposas. Nenhum deles tem nomes, apenas são suas funções. E apesar de todas as diferenças, todos têm algo em comum, oprimem as crianças. Meninos e meninas, todos com nomes, que vão crescer com o peso da derrota da Primeira Guerra Mundial, e que estarão sugestionáveis a aceitar os desmandos de Adolf Hitler e seus seguidores.

Mas quem conhece a obra do cineasta alemão sabe bem que não é a sua proposta responder perguntas. Não foi por dizer os motivos do nazismo que Haneke levou a Palma de Ouro em Cannes, mas justamente por não dizer. O diretor não busca fórmulas prontas, respostas para todas as questões, apenas ainda mais perguntas que também estão longe de serem respondidas. Quem prefere um roteiro convencional, em que tudo se encaixa bem e, no fim, tudo se resolve, não vai gostar de qualquer filme dele, seja A Fita Branca, Caché, Funny Games ou qualquer outro. Para os outros, as obras de Haneke começam de verdade quando os créditos sobem e as luzes se acendem.

A Fita Branca (Das Weisse Band, 2009, Alemanha)
Direção:
Michael Haneke.
Roteiro: Michael Haneke.
Elenco: Christian Friedel, Burghart Klaußner e Ulrich Tukur.
144 Minutos